Retrato sem retoques do 11/9

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Retrato sem retoques do 11/9

Por Paulo Moreira Leite

Vinte anos depois do atentado às Torres Gemeas, vale a pena entrar no Netflix para assistir “Ponto de Virada: 11/9 e a Guerra contra o Terror”, escreve Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia

Em cinco episódios, o documentário “Ponto de Virada…”, de Brian Knappenberger, presta homenagem ao sofrimento da população civil norte-americana, reconstituindo a dor das famílias que perderam cerca de 3 000 vidas no atentado.

Seu maior mérito, contudo, é contar a tragédia inteira, narrando os capítulos seguintes, como a invasão do Afeganistão e mais tarde do Iraque, numa reconstrução minuciosa dos fatos que ajudam a compreender a realidade bruta que redesenhou a geopolítica do planeta nas duas últimas décadas.

A experiência humana ensina que é errado empregar a matemática para avaliar a gravidade maior ou menor de tragédias de nosso tempo. Toda comparação, assim, tem um aspecto problemático, pois envolve vidas individuais, únicas e insubstituíveis.

Apesar disso, não custa registrar que, ao longo de duas décadas, as operações militares estadunidenses deixaram 150 000 mortes apenas no Afeganistão, número equivalente a 50 vezes os atentados de Nova York.

“Ponto de Virada…”se debruça sobre decisões e debates internos dos governos de George W Bush e Barack Obama, período em que generais e altos funcionários do Estado norte-americano produziram uma guerra de grande utilidade para a afirmação do poder imperial norte-americano na fase final da Guerra Fria.

O documentário conta com mais detalhe e maior profundidade os episódios já conhecidos, como a lenda de que Saddam Hussein produzia “armas de destruição em massa”, apresentada pelo Secretário de Estado Collin Powell na ONU para tentar justificar a invasão do Iraque.

Menos conhecido do grande público, o advogado Alberto Gonzales, PGR de George W Bush entre 2005 e 2007, dois anos decisivos, aparece num longo depoimento. Num governo acusado de institucionalizar a tortura de prisioneiros, sequestrados e mantidos em locais secretos por longos períodos, sem advogado, a entrevista chama atenção por um sorriso permanente e estranho.

Ao se debruçar sobre uma tragédia que marcou o século XXI, Knappenberger fez questão de homenagear vozes que tentaram se opor aos movimentos do império. O filme abre espaço para Barbara Lee, deputada Democrata da Califórnia — o único voto contrário à invasão, em mais de 400 parlamentares.

Na última cena, o documentário exibe as palavras de um líder muçulmano estabelecido em Nova York, que coloca o dedo numa das grandes feridas do império: “Os Estados Unidos mostram seu melhor lado quando aceitam que a igualdade deve ser para todos”.

Alguma dúvida?

Ludwig Gutschmied

Para completar, um texto de um jornal alemão: Milhões de vítimas mortais, pobreza ardente, dúzias de milhões de refugiados e vários países totalmente destruídos: este é o resultado das guerras ocidentais em todo o Médio Oriente desde 11 de Setembro de 2001, lançado em nome da terror jihadista, travado sob a bandeira de propaganda de ‘liberdade’ e ‘democracia’. As guerras no Afeganistão, Paquistão e Iraque, na Síria, Iémen e Somália, causaram sofrimento humano e miséria a uma escala histórica.

Os objectivos reais ou alegados não foram alcançados: em lado nenhum, em nenhum lugar, nem no Hindu Kush nem no Eufrates e no Tigre, surgiram sociedades prósperas. Segundo especialistas, o terror jihadista é hoje mais forte e mais difundido a nível mundial do que era em 2001. Na guerra contra o terror, as forças armadas ocidentais e os serviços secretos cometeram os crimes de guerra e de direitos humanos mais graves – que vão desde o assassinato de civis desarmados até à deportação de milhares de pessoas para a tortura.

A República Federal da Alemanha esteve envolvida em tudo isto.

A miséria dos refugiados

As guerras lançadas desde 11 de Setembro de 2001 causaram, não menos importante, uma miséria sem precedentes dos refugiados, que só é ultrapassada pelo mundo inteiro movimentos de refugiados durante a Segunda Guerra Mundial. O Projecto Custos da Guerra coloca o número de refugiados afegãos em 5,9 milhões. Paquistão tem 3,7 milhões de refugiados, Iraque 9,2 milhões, Síria (desde 2014) 7,1 milhões. Além disso, há 4,6 milhões de Jemenitas e 4,3 milhões de refugiados somalianos – um total de 34,8 milhões.

A maioria dos refugiados que deixaram o país encontram-se nos países vizinhos, no caso dos refugiados afegãos, no Paquistão e no Irão, e Irão, refugiados sírios principalmente na Turquia, Líbano e Jordânia. Os países ricos do Ocidente, responsáveis pelas guerras, consistentemente repelem refugiados com muros e arame farpado

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