“A resposta é simples: porque foram cúmplices de uma das maiores farsas políticas da história da humanidade, que permitiu a ascensão de um governo neofascista no Brasil”, diz o jornalista Leonardo Attuch, editor do 247
14 de janeiro de 2020, 07:13 h
Pela primeira vez em sua história, o Brasil tem a chance real de vencer um Oscar, o maior prêmio do cinema internacional. Se estivéssemos vivendo uma situação de normalidade democrática, a indicação do documentário “Democracia em Vertigem”, da cineasta Petra Costa, seria comemorada por toda a sociedade. As reações a esse acontecimento, no entanto, confirmam a tese do documentário: a democracia entrou em vertigem no Brasil e foi solapada com o impeachment sem crime de responsabilidade contra a ex-presidente Dilma Rousseff em 2016 – ou seja, com o golpe de estado.
De um lado o secretário de Cultura, Roberto Alvim, que conseguiu seus 15 minutos de fama ao insultar Fernanda Montenegro, maior atriz do teatro brasileiro, enquadrou o filme como ‘ficção’. Em nota oficial, os tucanos, que organizaram o golpe de estado porque não aceitaram a quarta derrota eleitoral, com Dilma, e a perspectiva de uma quinta, com Lula, expressaram sua dor de cotovelo. A deputada Janaina Paschoal (PSL-SP) disse que não viu e não comentaria, mesmo caminho escolhido pelo usurpador Michel Temer – que entrará para a História por redimir a biografia de Joaquim Silvério dos Reis, aquele que traiu Tiradentes. Daqui a 50 ou 100 anos, quando buscarem um sinônimo para a palavra traidor, ninguém mais dirá que tal sujeito é um “Silvério”. Dir-se-á: “por aquela rua ali caminha um Temer”.
Pois bem: de maneira contida, Petra celebrou a indicação de seu filme ao Oscar e disse que ele chamou a atenção da academia porque a democracia está em vertigem em todo o mundo, sob pressão da extrema-direita. De fato, o tema mais estudado pela ciência política nos dias atuais é a corrosão das democracias ocidentais, o que está presente em livros como “Fascismo”, de Madeleine Albright, e “Como as democracias morrem”, de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt. O mundo deve assistir atentamente ao documentário de Petra justamente para não se tornar um novo Brasil – de todos os laboratórios globais do neofascismo, o mais escatológico.
Assim como os protagonistas do golpe de estado de 2016, os jornalistas que lhes deram cobertura também se revoltaram com indicação do filme. O motivo é simples: todos eles foram cúmplices de uma das maiores farsas políticas da história da humanidade, que permitiu a ascensão de um governo neofascista no Brasil. Não podem dizer que eram contra a corrupção, porque jamais combateram governos muito mais corruptos que vieram depois – os de Temer e companhia e o da rachadinha. Não podem mais sustentar a farsa de que as “pedaladas” quebraram o País, porque os rombos fiscais hoje são muito maiores e a economia ainda anda de lado, quatro anos depois do golpe de estado. Perderam a narrativa, perderam o discurso, mas tentam ganhar no grito. Mas a verdade, como diz a ex-presidente Dilma Rousseff, não pode ser enterrada e a história será implacável com os golpistas.
A verdade é paciente e tem o tempo como seu maior aliado.