As mortes de Paraisópolis não contam para as elites, mas são o coração arrancado dos pobres
O jornalista Mauro Lopes, que integrou a comunidade de Paraisópolis como ministro da Palavra e da Eucaristia, escreve um depoimento sobre o massacre dos jovens da favela, destinado à missa de sétimo dia que se realiza neste sábado (7)
7 de dezembro de 2019, 17:27 h
Na noite do massacre de Paraisópolis, domingo passado, eu estava em Salvador, por conta dos lançamentos de “Lula e a Espiritualidade”. Os capitães do mato dos senhores de escravos de hoje mataram nove dos nossos jovens, cada uma e cada um esperança para todo o povo brasileiro.
O querido amigo padre Luciano Borges Basílio pediu-me um breve depoimento sobre o massacre, para a missa de sétimo dia deste sábado (7).
É o que se segue:
“Integrei a comunidade de Paraisópolis por quase dois anos como ministro da Palavra e da Eucaristia da Paróquia São José.
Andei das ruas do alto aos baixios mais miseráveis desta verdadeira cidade de pobres. Sempre em alegria pela convivência, pela partilha, tantas vezes com o coração apertado e às lágrimas pelas injustiças e desumanidade a que os cerca de 50 mil moradores e moradoras são submetidos pela ganância dos ricos do Brasil.
Há para as elites brasileira, mortes que contam e mortes que não contam. As mortes dos indígenas não contam. As mortes dos pretos e pretas feitos escravos não contam. As mortes dos pobres não contam.
Tem sido assim desde que o Brasil foi invadido pelos portugueses. Quem ousa levantar a cabeça, quem ousa contestar, quem ousa uma vida em liberdade, quem ousa a alegria merece a morte, para as elites. E essas mortes não contam.
Não contam, para eles, as mortes de milhões de indígenas, de milhões de pretos e pretas, de milhões de pobres.
A máquina de morte das elites brasileiras matou nos navios negreiros, matou em Palmares, matou em Canudos, matou em Eldorado dos Carajás.
Mata nas favelas, morros, alagados, nas periferias, nos campos.
Para eles, não contam. Para nós, cada morte dessas conta e é o coração arrancado do peito de seus familiares, amigos, amigas, do povo.
Cada um, cada uma, tem seu nome, sua história, seu sangue. Seus sonhos foram cortados, assassinados.
Agora mataram no chão de Paraisópolis, nossa comunidade.
Mataram jovens, nove vidas preciosas, insubstituíveis.
Pode haver quem não concorde com a maneira com que esses jovens festejam. Mas eles são assim mesmo, jovens, contestadores. Querem o direito à alegria. Não podem ser mortos por isso. Mas foram.
Eles estão dentre os milhões de mortos. Para nós, cada uma e cada um deles conta. São nossa gente. São o povo brasileiro:
Bruno Gabriel dos Santos, 22 anos;
Dennys Guilherme dos Santos Franco, 16 anos
Denys Henrique Quirino da Silva, 16 anos
Eduardo da Silva, 21 anos
Luara Victoria Oliveira, 18 anos
Gabriel Rogério de Moraes, de 20 anos
Gustavo Cruz Xavier, 14 anos
Marcos Paulo Oliveira dos Santos, 16 anos
Mateus dos Santos Costa, 23 anos”